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APLOP em foco 
JORNAL DA ECONOMIA DO MAR

Portugal, APLOP e CPLP

Afirmar, parafraseando, uma vez mais, o nosso tão celebrado Pessoa, ser tão importante a APLOP como a própria CPLP, havendo é menos quem verdadeiramente o compreenda, para além de poder parecer excessivo, exige, talvez, uma explicação.

Os mais atentos não deixarão, com certeza, de logo sorrir interrogativamente: correspondendo a APLOP, constituída em Maio de 2011, à Associação de Portos de Língua Portuguesa, ou seja, uma organização de carácter meramente sectorial, não se afigura algo temerário atribuir-lhe uma importância equivalente a uma organização, como a CPLP, criada no propósito de elevar as nações de Língua Portuguesa ao seu mais universal ideal político?

Talvez, mas isso não significa que seja, necessariamente, um erro, ou menos ainda, um completo disparate.

De facto, se olharmos para a História e, muito em particular, para a História de Portugal e de todas as nações por si criadas, logo vemos como as respectivas capitais, assim como as grandes cidades, sempre foram cidades ribeirinhas ou cidades portuárias por excelência, como sucede de Lisboa a Díli, passando por Luanda, Lourenço Marques, hoje Maputo, sem esquecer Bissau e não contando, evidentemente, com os arquipélagos como Cabo Verde e S. Tomé e Príncipe, por maioria de razão.

Na actualidade, como também se sabe, a única excepção é Brasília que, depois de Salvador e do Rio de Janeiro, foi construída de raiz, a partir e no meio de quase nada, por razões de ordem político-administrativa, não deixando com esse passo de continentalizar o Brasil um pouco mais do que talvez fosse de esperar e do que muitos Brasileiros entendem mesmo estrategicamente adequado, perfeitamente compreensível quando começou a emergir a era do que veio a ser designado como a Amazónia Azul.

Hoje, é certo, chama-se muito a atenção para a importância das cidades e ouve já defender mesmo comumente a tese, não raro, naquele grandiloquente tom de cousa extraordinária, nunca vista nem ouvida, de a competição determinar-se actualmente muito mais como competição entre cidades do que entre nações, uma vez serem as cidades quanto fazem as nações competitivas.

A nós também surpreende um pouco. Não bastaria pensar apenas nos momentos áureos de Portugal para logo compreender como os mesmos sempre estiveram intrinsecamente ligados à grandeza de Lisboa, enquanto porto, quando Portugal soube transformar destronar Veneza como a grande capital europeia do comércio com o oriente?

Sim, e mais ainda hoje, quando o mundo está a litoralizar-se e a globalizar-se, é natural que grande parte das maiores e principais cidades do mundo, e com os mais altos índices de crescimento e expansão, sejam grandes cidades portuárias, litorais, salvo alguns poucos casos em que, não sendo litorais, dispõem, todavia, de importantes portos fluviais, com boa ou mesmo excelente interligação ao mar, ou seja, ao um, ou a mais do que um, bom ou mesmo excelente porto marítimo.

Assim como nesse contexto tampouco surpreende que alguns dos mais importantes conflitos subsistentes na actualidade do mesmo mundo, respeitem exacta e muito simplesmente ao acesso, ou não, ao mar ou, em alguns casos, às também ditas águas quentes, pelas razões que todos compreendem e sabem.

Tendo simultaneamente em atenção a evolução do mundo nas últimas décadas, a ninguém escapa, por um lado, com certeza, dever-se a ascensão da China e do mundo à sua entrada para o GATT, o célebre Acordo Geral (mundial) sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio, bem como, por outro, a uma crescente interligação comercial entre as nações economicamente mais avançadas do mundo, sendo mais de 90% desse mesmo comércio, havendo até quem aponte para 95%, realizado por via marítima.

Para Portugal, pequena nação com uma economia particularmente aberta ao exterior, tudo isto importa e é significativo.

Evidentemente que muito distintas são a realidade particular das nações que compõem a CPLP e, por maioria de razão, muito distintas também a particular realidade dos portos associados da APLOP. Mas há constantes também, evidentemente, como a imperiosa e crescente interligação produtiva entre todas as nações e consequente necessidade de intensificação das respectivas trocas comerciais entre as mesmas nações, não deixando de implicar igualmente um igual apuramento das correspondentes cadeias logísticas onde, evidentemente, portos, sempre equivalentes de um ponto de vista conceptual, se assumem como um elemento crucial.

Apear de todas as diferenças e distintas realidades, um porto, de um ponto de vista conceptual, é sempre um porto, estejamos a falar de Portugal, do Brasil, de Cabo Verde, Angola, Moçambique ou Timor.

Antes de mais, um porto tem que ser administrado, não se se ter sempre em devida atenção à realidade particular e respectivo estádio de evolução de cada caso, naturalmente, mas as práticas e a experiência adquiridas são universais e um maior conhecimento dessas mesmas distintas e diferentes práticas e experiências não deixará nunca de se constituir como uma mais valia e, eventualmente, até mesmo como uma possível vantagem competitiva significativa.

De um ponto de vista mais político de evolução da própria CPLP, não deixando nunca de ser importante uma maior aproximação entre todos os povos, tal não deixa significar também uma maior e mais intensa relação económico-comercial entre todos, onde, evidentemente, por tudo quanto já referido e o mais subentendido, os portos não deixarão nunca de assumir também o seu crucial papel.

Com certeza, os portos não geram carga nem comércio de per se, mas sem portos eficientes também não comércio que o valha e há, também nesse plano, alguns aspectos onde uma associação como a APLOP pode vir a desempenhar um papel determinante, além da simples questão de administração portuária ou até mesmo de uma certa visão estratégica de desenvolvimento mais largo no que vulgarmente se designa na gíria como foreland e hinterland, ou seja, nas interligações eventualmente nacionais e internacionais com outros portos e nas interligações nacionais e eventualmente internacionais com os territórios continentais interiores.

Sabe-se como, em tempos, perante a ausência de qualquer grande armador no seio da CPLP, alguns esforços foram despendidos a pensar a possibilidade e exequibilidade de formação de um grande armador nesse âmbito.

Sabendo-se como, mesmo numa nação como o Brasil a cabotagem é primordialmente realizada por grandes armadores internacionais, ou filiais de grandes armadores internacionais, percebe-se facilmente o eventual interesse de uma tal solução.

Porém, nem tudo depende apenas de uma questão de «vontade» mas, nestes casos sobretudo, de reais oportunidades de mercado e, como se sabe, se há mercado complexo, difícil e até mesmo eventualmente traiçoeiro, se assim se pode dizer, é exactamente o mercado do transporte marítimo, pelo que tal requer mais maturação para se perceber também da sua efectiva possibilidade num mercado tão duro como duro é realmente o mercado do transporte marítimo.

Acresce, por outro lado, como se vê pelas actuais Alianças, como o mercado do transporte marítimo também está crescentemente dominado pelos grandes armadores, em feroz competição e que, não sendo donos das respectivas cargas, não deixam de ter hoje um poder significativo na determinação da sua evolução e até mesmo, consequentemente, no eventual êxito ou fracasso de alguns projectos portuários.

Nesse plano, à medida que as cadeias logísticas se vão sofisticando e integrando, é, para os portos um ponto cada vez mais crítico, naturalmente, o respectivo grau de eficiência e de competitividade atingidos, uma vez competirem também, cada vez mais, entre si.

São as administrações portuárias que determinam, por si, a eficiência de um porto?

Podendo ter maior ou menor contributo para isso, na realidade, pouco determinam, porém. Quem determina a efectiva eficiência de um porto são, evidente e primordialmente, os respectivos operadores portuários e, não por acaso, ou exactamente por isso, grandes armadores como uma Maersk, não deixam de ter também a sua própria empresa de operação portuária.

O que faz a eficiência da operação portuária?

Múltiplos serão, com certeza, os diversos factores mas se pensarmos apenas nas questões relacionadas com os sistemas de informação e a automação, duas áreas, de resto, interligadas, logo ocorre também, evidentemente, as virtudes que nós Portugueses temos sabido vir a demonstrar nesses domínios.

Falamos dos Portugueses por ser o caso que conhecemos mas o ponto, aqui, não é estabelecer qualquer comparação entre Portugueses e restantes membros da CPLP mas a possibilidade de ser exactamente essa uma área a explorar no próprio âmbito da APLOP, como alguns passos parecem começar a ser dados e muito mais poder ser feito.

Embora nesse particular, como tanto outros, estejamos a perder também alguma massa crítica, vendo tudo num plano mais alargado de uma APLOP, possibilitando ganhar a escala e a dimensão que todo este tipo de projectos hoje requerem, talvez fosse mesmo possível ambicionar seguir uma estratégia de internacionalização e afirmação no mundo portuário que de outra forma se vê como de difícil concretização, sabendo todos também como, a partir desse momento, sempre há igualmente quanto mais sempre vem, ou pode vir, por simples arrasto.

Quando no X Congresso da APLOP, como referido, se vê falar já na possibilidade de projectos como o JUP e JUL, ou seja, da Janela Única Portuária e Janela Única Logística poderem vir a ser pensados à escala e em toda a amplitude da própria APLOP, a par os estudos em realização sobre as diversas legislações aduaneiras, tendendo, naturalmente, a perspectivar alguns passos de harmonização e estabelecimento de melhores práticas, vemos haver a passagem a um novo e mais importante plano de cooperação que tudo permitir começar a esperar.

Se, a par de tudo isso, lembrarmos igualmente a presença de Macau e da Administração Portuária de Marrocos, apesar de Tanger Med estar fora, mais se reforça a ideia de uma possível e efectiva afirmação internacional da APLOP, com a respectiva «Marca» a poder começar a fazer, de facto, a diferença.

E é exactamente nesse enquadramento que se percebe também a importância da APLOP no seio da CPLP enquanto efectiva realização da mesma, ou seja, tal como vai sucedendo um pouco na Defesa, talvez as duas áreas onde mais avanços efectivos se têm visto na realização CPLP, sem essa mesma realização, decisiva e determinante, nunca a CPLP poderia, ou poderá, adquirir verdadeira realidade, não ficando senão como conceito sem conteúdo, como conceito vazio, destituído de verdadeiro sentido ou significado.

Importa, por isso mesmo, além de darmos os parabéns à APLOP e à organização do seu X Congresso, apoiarmos, tanto quanto possível, à medida das possibilidades de cada um, a sua evolução e desenvolvimento, nunca esquecendo também que um porto é sempre como uma pequena cidade onde as possibilidades de desenvolvimento tecnológico são quase sem limites _ assim haja suficiente imaginação, o que, na modo de ser Português, seja declinado em que cambiante for, normalmente não falta.

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