Moçambique

NSANJE

O porto que causou uma crise diplomática

MOÇAMBIQUE e o Malawi estavam por estas alturas do ano passado mergulhados numa crise diplomática devido à tentativa deste último país de navegar os rios Zambeze e Chire, em direcção ao porto fluvial de Nsanje, sem a devida autorização das autoridades moçambicanas.

Este incidente criou alguma tensão no relacionamento entre os dois países e como forma de refrear os ânimos, o governo moçambicano acabou decidindo que o assunto deveria ser devolvido ao fórum de onde nunca devia ter saído, numa alusão, a Comissão Interministerial Conjunta, constituída por Moçambique, Malawi e Zâmbia.

A aventura malawiana custou a detenção temporária do seu antigo adido militar em Maputo, James Kalipinde e a intercepção de dois barcos que tinham como destino o porto fluvial de Nsanje.

Numa intervenção apresentada à Assembleia da República, a pedido de uma das bancadas parlamentares, o chefe da diplomacia moçambicana, Oldemiro Baloi afirmou resumidamente que o Malawi violou os procedimentos acordados no Memorando de Entendimento sobre a navegabilidade dos rios Zambeze e Chire.

Conforme foi referido na altura, o Malawi pretendia forçar Moçambique a aceitar a navegabilidade dos rios Zambeze e Chire sem um estudo de viabilidade económica e ambiental.

Um ano depois, nem água vem nem água vai. O porto de Nsanje, cuja primeira fase, custou cerca de vinte milhões de doláres, está cem por cento inoperacional. Dizem alguns críticos que o Porto de Nsanje, é um autêntico “ elefante branco” do Presidente Bingu wa Mutharika, que serviu apenas de mote político para a sua reeleição a 19 de Maio de 2009 e eventualmente para se beneficiar de avultadas somas de dinheiro em comissões por parte da empresa executora do projecto – a portuguesa MotaEngil.

Outras fontes alegam que todo o barulho que se levantou no ano passado a volta do projecto, foi apenas para entreter alguns distraídos pois sabia-se de antemão que aquele porto deixou de ser comercial já nos primórdios da década 50 do século passado quando a Inglaterra resolveu construir a ponte ferroviária Dona Ana sobre o Rio Zambeze de modo a ligar o Malawi ao Porto da Beira por linha férrea.

No discurso político e na imprensa local, a navegabilidade dos rios Chire e Zambeze já não consta da agenda, e com o Verão cada vez mais agressivo, o Porto de Nsanje, transformou-se num local de lazer e com os locais cansados de esperar pela atracagem de barcos provenientes de Moçambique.

Aparentemente o porto de Nsanje está inoperacional porque o Malawi não consegue mobilizar fundos estimados em três milhões e quinhentos mil doláres para a realização de um estudo de viabilidade sobre a navegabilidade dos rios Chire e Zambeze, conforme exige as autoridades moçambicanas.

Já desde o ano passado que o governo do Malawi tem vindo a anunciar que o Banco Africano de Desenvolvimento disponibilizou os fundos necessários e que o estudo deveria arrancar em Março passado por um período de três meses. Para o Malawi, a partir de Junho passado o porto entraria em funcionamento pleno uma vez se alegou que o estudo exigido por Moçambique era mera formalidade para cumprir com o que está previsto no memorando tripartido de entendimento Moçambique, Malawi e Zâmbia. Mas na prática nada se vê, sinal de que o BAD ainda não desembolsou o dinheiro necessário para o estudo de viabilidade, incluindo a dragagem dos Rios Chire e Zambeze.

A estratégia em vista e alegada pelos malawianos é tornar navegáveis os rios Chire e Zambeze desde Nsanje até ao Oceano Indico através do porto de Chinde, na Zambézia, numa distancia de duzentos e quarenta quilómetros, o que pode baixar os custos de importação dos produtos para o Malawi.

Os portos da Beira e Nacala constituem as rotas naturais para as importações e exportações malawianas, mas o Malawi alega que os custos de cabotagem e de transporte encarecem os produtos comercializados dentro das suas fronteiras em cinquenta e cinco por cento.

Daí que tenha optado em construir um porto fluvial de duzentos metros de cumprimento e cinquenta metros de largura, com uma profundidade de oito metros de modo a baixar os custos das mercadorias.

Mas Moçambique impõe como condição primordial para a tomada de uma decisão sobre a navegabilidade ou não dos rios Chire e Zambeze, a realização prévia de um estudo de viabilidade por uma empresa credenciada.

Recentemente e depois de fracassada a pressão do Malawi junto da SADC e do NEPAD para forçar Moçambique a reconsiderar a sua exigência, o Malawi tentou incluir o assunto na agenda da última Cimeira da COMESA sem sucessos.

A navegação dos rios Chire e Zambeze remonta desde os primórdios coloniais quando em 1859 o explorador escocês David Livingstone usou esta rota para chegar ao actual território do Malawi, naquilo que ficou conhecido como a descoberta de Nyassalândia.

A rota veio a ser factor de desenvolvimento colonial britânico do então território de Nyassalândia com a construção da linha férrea ligando Nsanje à cidade de Blantyre, uma ferrovia que presentemente está inoperacional.

Este facto teria inspirado o falecido presidente Kamuzu Banda a retomar a navegabilidade dos rios Chire e Zambeze para ter acesso ao mar.

O actual presidente Bingu wa Mutharika entende que tem uma missão histórica de concretizar aquele sonho do ditador Kamuzu Banda.

Maputo, 11 de Novembro de 2011

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