História

VIAJANDO PELA HISTÓRIA | GRIPE ESPANHOLA

A viagem em que o «navio da morte» Demerara venceu bombardeios alemães e levou a doença para o Brasil

O vírus, que hoje é conhecido como influenza e que ainda causa vítimas esporádicas, não chegou ao Brasil embutido no organismo de passageiros de aviões, até porque eles ainda estavam sendo inventados, mas sim a bordo de um único navio: o transatlântico inglês Demerara, que chegou ao porto de Recife, vindo de Inglaterra e Portugal, a 14 de setembro de 1918.

Os editores do jornal Gazeta de Notícias (1875-1942), do Rio de Janeiro, não estavam exagerando quando disseram, na edição do dia 16 de setembro de 1918, que o Demerara fez uma "péssima viagem". Quando zarpou de Liverpool, no dia 15 de agosto de 1918, rumo a Buenos Aires, o comandante do navio inglês, J.G.K. Cheret, não fazia ideia dos percalços que enfrentaria pelo caminho.

Já no dia seguinte, 16 de agosto, levou o primeiro susto: por volta das oito da manhã, o Demerara foi atacado por dois submarinos alemães, em plena Primeira Guerra Mundial. Um deles chegou a disparar um torpedo que, segundo jornais da época, passou "a um metro da proa". Os passageiros entraram em pânico e, temendo o pior, saíram à procura de "cintas salva-vidas" - o correspondente da época aos nossos coletes salva-vidas.

Com 562 passageiros e 170 tripulantes a bordo, o Demerara provavelmente teria afundado ali mesmo não fosse a intervenção salvadora de um porta-aviões inglês e de seis torpedeiros americanos, que abateram um dos submarinos e obrigaram o outro a bater em retirada. O jornalista e escritor Wagner G. Barreira explica que aquela não foi a primeira vez que o navio inglês travou uma autêntica batalha naval com submarinos alemães. "O Demerara foi o primeiro navio da marinha mercante britânica a afundar um u-boat. O capitão foi condecorado, ganhou prêmio. Mas, o vapor virou alvo da marinha alemã", relata o jornalista.

O avô de Wagner, o galego Bernardo Gutiérrez Barreira, chegou ao Brasil numa das muitas viagens do Demerara e, quase um século depois, inspirou o neto a criar o protagonista de seu primeiro romance histórico, Demerara (Editora Instante, 2020).

Passado o susto inicial, o Demerara seguiu viagem. De propriedade da Royal Mail, o serviço postal do Reino Unido, o transatlântico fazia a rota Liverpool-Buenos Aires e transportava, além de passageiros, mercadorias (açúcar, por exemplo) e correspondências. Na viagem de volta a Europa, levaria carne e café, entre outras provisões.

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